quarta-feira, 20 de junho de 2007

Carta aos ludovicenses

Será que alguém já parou pra observar até que ponto o fato de sermos Patrimônio Cultural da Humanidade interfere na vida de cada um?


A maioria da população usa esse título apenas com o intuito de vangloriar-se do fato e esquece que por trás de tudo isso há uma série de implicações no cotidiano não só de quem vive no centro tombado, mas de toda a cidade.


A partir do momento em que esse centro não conseguiu mais suportar as exigências da modernidade e que o eixo de crescimento da mesma mudou para as áreas mais próximas das praias, iniciou-se um conflito entre manter as antigas estruturas ou modernizar. E então o que era centro passou a se chamar de cidade antiga.



Parece que a resposta para esse conflito é evidente até hoje. Escolheram migrar pura e simplesmente para as novas centralidades e deixar o que outrora era o centro de tudo apenas em um passado a cada dia mais distante. E detalhe, esse acontecimento não restringe-se apenas ao deslocamento de famílias, que a princípio foram as precursoras, mas o setor de serviços, comércio e instituições públicas também estão seguindo o mesmo trajeto. Por quê?


Creio que muita gente concorda com o que acaba de ser relatado, entretanto permito-me contradizer-me. O centro ainda é um lugar vibrante. Não apenas por ainda concentrar um grande número de empregos e serviços, mas por abrigar a maior diversidade cultural e social, principalmente nas áreas que mantiveram o uso residencial.


Essa história de querer transformar o centro em algo histórico, como se fosse um grande museu, não trará nenhum diferencial para a cidade e particularmente não tem nada de atrativo. Os nossos casarões não devem ser vistos como peças isoladas desse gigantesco museu a céu aberto. É preciso passar para a população que ainda há vida em meio a essas velhas estruturas, e que por mais que sejam estereotipadas como detentoras da população de baixa renda da cidade, isso não é verdade. Fiz um estudo que comprova que mais da metade dos moradores da área persiste em morar no local por questões pessoais e não econômicas. Ou porque o imóvel é uma herança de família, ou porque fica perto da igreja da qual é membro, ou simplesmente pelos laços de amizade construídos. E é justamente esse o ponto em que quero chegar. De que adianta enxergar apenas as fachadas e esquecer que há vida além delas?


Não moro nessa área, infelizmente, mas pretendo um dia viver em meio a essa poesia que é o centro histórico. Acordar todo dia e perceber que, por mais que as pessoas mudem, a estrutura sólida persiste e que ela não impõe um retrocesso no cotidiano das pessoas, pelo contrário, somente quem possui sensibilidade para tal percebe que viver ali é estar à frente de uma sociedade cega que não percebe o verdadeiro patrimônio que tem.

Por Shenna Dallen

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